segunda-feira, 13 de abril de 2009

vigésima sexta tentativa para chegar ao mesmo sítio

Uma corda presa à janela do cérebro nem sempre tem a intenção de fazer descer uma mulher apaixonada.
Muito mais velho que a menina prestes a ser mulher é o homem que permanece à sombra. Ela deixa crescer o cabelo, encontrando, nesse acto, uma forma para descer do seu quarto sem que ninguém se aperceba da sua fuga. Nunca o cortaria, ao cabelo. No entanto, a vida não se tornaria suficientemente longa para que os fios capilares chegassem lá abaixo, à sombra, onde o homem mais velho continuava à sua espera. O erro, aqui, é arquitectónico: ou ela mora num prédio demasiado alto, ou a sua biologia não tem a força para crescer muitos metros seguidos.
Debaixo da sombra, o homem, anos mais tarde, morreu de velhice e de falta de paciência (de teimosia diriam outros). A menina, velha e gasta, ainda durou mais algum tempo; acabou, no entanto, por cortar o seu cabelo já branco.
Fiquei alguns dias a pensar nesta história e devo anunciar que existe nela muito mais pensamento do que aparentemente possa parecer.
Breves conclusões:
No amor, não podemos confiar nem em cabelos nem em cordas. O cérebro dos inteligentes, na maior parte das vezes, deixa de conseguir segurar a pilosidade – tem muitas outras funções menos físicas, o cabelo, e aqueles dois seres (o homem mais velho que permaneceu à sombra e a menina que deixou crescer o cabelo) utilizavam mais as partes do corpo que sabem pensar do que aquelas que sabem fazer.

autor: rui almeida paiva

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